quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

A arte do meio jogo


Após a abertura entra-se na fase de maior riqueza de um jogo de xadrez - o meio jogo.
O meio jogo é sumptuoso e único. Não pode, ao invés da abertura, ser apoiado exclusivamente em jogos anteriores. É pois nesta fase que se revela a elegância e a energia própria, de cada jogador.

Sendo vasto o número de posições possíveis no tabuleiro, esta fase jamais poderá ser estudada como a abertura. O plano de jogo assume aqui a sua máxima relevância. Para traçar plano de jogo devemos adicionar aqui os seus dois coadjuvantes: a estratégia e a táctica.

A estratégia é um termo originário do campo militar, aplicado ao xadrez pode ser entendido como a definição clara de objectivos e o estabelecimento de linhas de acção para que os mesmos sejam atingidos. Na crónica "Plano ou ruína" já se indicaram alguns factores que devem ser explorados dentro de uma boa estratégia, os ditos elementos estruturais.

Entendendo o plano como uma árvore, terminada a abertura temos construído o tronco e a estratégia vai dar azo ao crescimento dos ramos principais. A árvore está naturalmente despida, como no Outono. O germe para o surgimento da Primavera é, aqui, a táctica.

O cerco de uma peça, a interrupção da via das peças, a abertura do caminho das peças, a atracção, a prisão, o desvio, a ameaça e o ataque duplo são, de entre outros, alguns elementos da táctica xadrezista.

Esta fase do jogo, mais que qualquer outra, sempre me fez lembrar os Templários. Quiçá, influência de Amin Maalouf através da obra, que recomendo, "Les Crisades vues par les Arabes". Ou mesmo, por a cidade dos Templários ser um usual entremeio das minhas viagens na adolescência, e na qual sempre fui forçado a ocupar um par de horas entre transportes. Num destes entremeios, há 25 anos, depois de um passeio junto ao Nabão dei de caras com "Fundamentos do Xadrez - o meio jogo", de Ludek Pachman, escarrapachado numa montra da rotunda Alves Redol.

Para exemplificar a riqueza e a arte consagrada no meio jogo usa-se aqui um jogo de Pachman vs Pilnik, acessível no sítio:

http://www.chessgames.com/perl/chessgame?gid=1104901



Na posição apresentada no diagrama acima as brancas aspiram à abertura de linhas para atacar directamente o rei negro. A última jogada sobre o tabuleiro, foi 15 ..., Teb8, o que mostra que as negras não temem a abertura da coluna h, e tentam lançar o seu próprio ataque pela ala de dama.

As brancas forçam então a abertura da coluna g, com sacrifício de 16 Cf5!, gxf5; 17 gxf5. As negras são forçadas a aceitar o sacrifício para não perderem o cavalo em f6. 17 ..., Be8; 18 Tdg1, Cg6. As negras planeiam voltar a fechar a coluna g, devolvendo a peça, para se concentrarem depois na ala de dama.

Mas, as brancas mantém a pressão sobre a coluna g jogando 19 f4!, b5; 20 hxg6, fxg6; 21 fxg6, hxg6; 22 f5!, bxc4. A todo o custo as negras pretendem expandir-se na ala de dama. Mas, as brancas mantém-se fieis ao seu plano inicial jogando, sem perda de tempo, o seu bispo em 23 Bf1!, Ta7; 24 fxg6, Tab8; 25 Bf6+, Bxf6; 26 Bh3, Bd7; 27 Df2!

A força do plano branco já suplantou completamente o plano das negras e além disso observa-se uma cooperação fortíssima entre as peças brancas que já não poderá ser demolida. É pois com muita elegância que o jogo terminou com vitória das brancas depois de 27.., Tf8; 28 g7, Bg5+; 29 Txg5, Txf2; 30 Be6+

O plano das brancas assentou numa estratégia que passou pela abertura da coluna g. Os elementos de tácticos usados pelas brancas na prossecução do seu plano também são motivos de grande riqueza, passando pelo sacrifício de peças, permitiu ganhar espaço e tempo para alavancar o seu ataque esmagador, pese embora a forte ameaça que as negras exerciam na ala de dama.

O meio jogo é sempre um assunto em aberto, a que se voltará.

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